sábado, 22 de maio de 2010

Os livros espíritas e espiritualistas

Dois assuntos recentes que li me fizeram relembrar alguns momentos que passei quando engajado no movimento espírita, a importância dos livros espíritas.

A farta, mas não tanto quanto agora, literatura espírita e espiritualista na época se misturavam nas prateleiras.

Tudo era novidade e interessante.

De Rochester a Ramatís, Pietro Ubaldi a Roustaing, e todos aqueles que foram psicografados pelo médium Chico Xavier, eram qualificados pelas editoras no mesmo patamar de importância. Sem falar, lógico, dos romances espíritas de Yvone Pereira, Zibia Gaspareto e outros médiuns que encantavam com os dramas e suas causas envolvendo a vida encarnada e espiritual.

Paralelamente à edição oficial, em que a FEB teve e tem grande mérito da divulgação do espiritismo pela publicação maciça de livros que avançaram além das fronteiras da língua portuguesa, as editoras, Edicel (hoje não existe mais) – lançou clássicos importantes, Instituto de Difusão Espírita (IDE) a “Revue Spirite” de Kardec, foi um sucesso, o Clarim, Sociedade Editora Espiritualista F. V. Lorenz, DICESP – Divulgação Cultural Espírita, lançaram nomes como J. Herculano Pires, Hermínio Miranda, Jorge Andréa, Deolindo Amorim e a tantos outros que me ensinaram a ver a Doutrina Espírita com lupa nos olhos e auscultar a leitura com cuidado clínico.

Evidentemente, as obras básicas de Allan Kardec, com a variação de três traduções (Salvador Gentile, J. Herculano Pires e Guillon Ribeiro), que formaram toda a estrutura da filosofia que mostra um lado nada oculto da vida, constituíram a linha do meu pensamento.

Volto então, ao assunto que me despertou as lembranças.

O primeiro foi o email do amigo médico-pediatra, que advertia para a preocupação com o livro “Voo da Esperança”, assinado por "Alberto Santos Dumont" psicografado pelo "médium" Woyne Figner Sacchetin, sobre a tragédia da TAM ocorrida em julho de 2007, em São Paulo. O mesmo livro foi motivo da coluna de um jornal do Distrito Federal, que o tratou de charlatanismo.

O segundo, a coluna de Carlos Heitor Cony, com título “O ovo e a galinha”(somente assinante do UOL), sobre o livro do aiatolá Khomeini, “A Explicação dos Problemas”. Com fina ironia que lhe é peculiar, Cony ressalta o livro como “um repositório de sabedoria e de fecundos ensinamentos para a vida moral e prática”. Destaca entre os ensinamentos: “não posso ter filhos com a irmã da minha sogra, com a tia da minha prima (que pode ser minha própria mãe)” e que “em compensação, desde que faça certas abluções e tenha os olhos e o coração voltados para Meca, posso ter relações sexuais com o pai, o filho e os primos de minha mulher”.

Os livros têm a saúde que o autor lhes dá. Quando o conteúdo tem o respeito do leitor, será admirado e naturalmente divulgado. Quando apenas desperta curiosidades, uma vez saciada passa-se para outro.

Quando ofende, tem a justiça para reparar tal erro. No caso do “Voo da Esperança” a justiça entendeu dessa forma com a sentença, proibindo a publicação de novas edições e a indenização altíssima aos parentes das vítimas.

Não me assusta e nem me preocupa as insinuações que todos os livros mediúnicos estejam vinculados à doutrina espírita. Os espíritos estão por toda parte e encontram as mãos de médiuns despreparados para divulgar, quando não o próprio animismo chega ao destempero.

Diante de tanta informação a exigência da pureza é algo utópico. As razões vão desde ao sincretismo cultural e religioso, aos interesses econômicos das editoras. As obras se sucedem. Clovis Nunes, certa vez numa palestra chegou a mensurar que a cada mês são lançados mais de trinta obras de cunho espiritualista. É impossível e desnecessário ter controle e o patrulhamento ideológico é um perigo.

Kardec afirmava “a convicção não se forma senão com o tempo por uma contínua observação feita com um cuidado particular”.

Portanto, faz parte do jogo, ou do joio.

sábado, 8 de maio de 2010

Quase morte

O Programa do Jô, no dia 06 de maio, entrevistou Psicólogo e neurocientista Júlio Peres para falar sobre o lançamento de seu livro "Trauma e Superação" e, evidentemente, sobre a vida após a morte.

Da entrevista o interessante mesmo foi o posicionamento autêntico de Jô Soares na abordagem do tema. Do outro lado da mesa,  a tarefa árdua e a dificuldade de quem se dedica à pesquisa numa área tão complexa. Em se tratando de brasileiro,  o obstáculo é redobrado.

Como carregamos a fé como instrumento de sobrevivência, para o pesquisador extair daquilo que é humano para apresentar o espírito é um espinhoso trabalho, porque a ausência de evidências são quantitativamente bem maiores. Resta sempre aos cientistas teóricos a esperança, uma vez que "ausência de evidência não significa evidência de ausência", como afirmou Carl Sagan.

Entre crer e a prova concreta da ciência, vamos caminhando entre afirmações e negações.

Num programa de entretenimento como o do Jô Soares, Dr. Julio Peres não precisava ser tão técnico. O marketing do livro estava na relação direta de sua apresentação, poderia ser mais espontâneo, mas para tanto, claro, estaria sentado da cadeira do Jô.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Sucesso do além

Foi o título da capa do caderno Ilustrada da Folha de São Paulo no dia 26/04 para comentar o filme e a onda de produções ligadas ao Espiritismo.

Nada de estranhar por se tratar de um caderno de assuntos culturais, onde filmes, teatro, TV e coisas do gênero por ali passam, em críticas, análises, sugestões de espetáculos e variadas crônicas de escritores importantes.

A abordagem está focada na questão do sucesso que as produções de caráter espírita vêm tendo com o público. Matéria elaborada por Fernanda Mena e Laura Mattos faz uma análise fincada no aspecto de entender o por quê. O "ser ou não ser" como sub-titulo, expõe a dúvida para entender as razões de tanto interesse pelo fato de que somos apenas 4 milhões de adeptos.

A matéria bem elaborada inclui Célia Arribas, socióloga e pesquisadora da USP, autora do livro "Afinal, Espiritismo É Religião?" e Sandra Stoll, autora do Livro "Espiritismo à Brasileira, ao trabalho jornalístico enfocando os motivos possíveis do volume nas bilheterias.

Ao lado do mercado promissor, cuja massa ávida por informações sobre o além, a matéria é sintetizada numa pequena frase questionadora: “Afinal, quem é que não quer saber como é a vida após a morte?

Lembrei-me, quando há um tempo atrás no curso de filosofia de uma universidade, foram convidados para falar sobre religião, um teólogo, um católico, um pastor evangélico e um espírita, cuja responsabilidade me incumbiram. Os quatro diante dos alunos o que mais respondeu pergunta foi o Espiritismo. Era fácil de entender, o Espiritismo é novidade. A curiosidade para conhecer seus princípios e fundamentos e principalmente os fatos mediúnicos são a atração para qualquer um.

Embora o assunto tome conta das conversas há, talvez por ciúme infantil, por parte dos receosos a preocupação exacerbada do assédio cinematográfico aos personagens importantes do movimento brasileiro, como Chico Xavier e Bezerra de Menezes.

A sacralização de temas e das pessoas é fruto ainda do sincretismo religioso existente nas casas espíritas. Acreditam que a divulgação do Espiritismo não pode ser proselitista. Mas é nisso que está o grande equívoco. Por tratar exclusivamente a Doutrina Espírita como religião, comportam-se como fiel a salvar almas.

No "O Livro dos Médiuns", Kardec já mostrava que "ensinar não é somente o que se faz do alto da cátedra ou da tribuna; há também o da simples conversação." Se o alcance de um só esforço atende milhares de pessoas, por que não?

O filme, a novela ou outro veículo de comunicação têm a capacidade estabelecer a relação com a massa de maneira lúdica cuja mensagem além entreter convoca todos a pensarem – o que vem depois da morte?

O Espiritismo "aborda todas as questões que interessam a humanidade", esse cuidado Kardec teve ao afirmar, "antes de torná-lo espírita, tentai torná-lo espiritualista".

O “Sucesso do Além” ultrapassa a barreira das crenças porque atinge as questões fundamentais de vida ou de morte a qual todos temos direito em saber

Como fonte de informação,o Espiritismo não converte, esclarece, é nisso que está o interesse geral.

domingo, 18 de abril de 2010

Como aprendi o Espiritismo

Em novembro de 2008, escrevi um texto que traduzia, em parte, como foi minha trajetória com a filosofia espírita.

Resolvi escrever naquela época porque havia, como há ainda hoje, os procedimentos padrões das casas espíritas na leitura do Evangelho Segundo o Espiritismo como a "bíblia oficial" de cabeceira, fonte única de contato com o Espiritismo.

Escrevi talvez como uma forma de desabafo, mas guardei o conteúdo no intuito quem sabe de um dia divulgá-lo.

Em 2009, como participo de um grupo de Estudo que se reúne ha 15 anos para estudar minuciosamente o que tem para oferecer o Espiritismo para uma vida digna - mais a frente escrevo sobre esse grupo, resolvi colocar meus amigos a par do texto do meu contato com a Doutrina Espírita (DE).

Assim, como alguns dos amigos fizeram suas observações críticas a respeito, hoje deixo a todos o mesmo posicionamento com espírito aberto às observações e críticas.




Com a DE aprendi a diversidade que somos



"Na intimidade com a Doutrina Espírita
Quando fui apresentado a Doutrina Espírita (DE) sua fisionomia era um tanto estranha e complexa, diria mesmo horrorosa. Seu aperto de mão foi o “Memórias de um suicida” de Yvone Pereira. Aquele calhamaço impressionou em dois meses de leitura. As conseqüências das atitudes niilistas do ser humano diante da inexistência de perspectivas depois da morte, agora com a DE, passaram ser assustadoras.
Nesse primeiro contato a impressão foi de grande apreensão. A imaginação me permitiu visualizar os que saíam de cena, por essas atitudes, o pós-morte, de forma fantasiosa. Mas, a imunização dos “infernos e purgatórios” religiosos que continuamente abominava me permitiu superar o sentimento de temor. O raciocínio era simples, entre essa atitude tão dramática - o suicídio e outras milhares formas de morte, o ser humano também teria destinos variados e em consonâncias com as existências da suas vidas encarnados, sem penalizações radicais.
A dedução me estimulava nesse emaranhado de máximas e sentimentos alguma linha lógica da existência, do viver e do por quê.  A busca me permitiu ser apresentado a outros livros que se figuravam como Doutrina Espírita.
Uma segunda apresentação produziu uma impressão mais branda e estimuladora, mas ainda incompleta, do que seria a Doutrina Espírita. Muito prazer, sou as obras de André Luiz. A pompa se valia da vida e do aprendizado que o autor passou num mundo desconhecido. Ele “lá” e eu de cá, comecei entender um pouco do mundo dos mortos. Destrinçar os 13 livros exigiu observar a morte em todas as particularidades. Mesmo sem prova da continuidade da existência, o encadeamento lógico se firmava começando demolir o muro do conceito de vida e de morte. O tempo foi a ferramenta que permitiu assimilar o novo paradigma.
 As circunstâncias proporcionavam curiosidades, mas ainda se valia de exemplos particulares, com fundo de regras morais, que tendiam a generalização. Um perigo para a tendencialidade e um risco para a volta da crença e da fé como únicos e verdadeiros instrumentos de compreensão.
As múltiplas faces que apresentavam a Doutrina Espírita não conduziam à coerência das idéias e sentimentos que dela falavam. Obras sagradas, como o do autor espiritual Emmanuel, proliferado nas prateleiras das livrarias e nas mãos dos adeptos inspiravam pensamentos e conduziam comportamentos.  Os assuntos bíblicos tornaram-se mais importantes que as obras básicas da DE. Dela extraiam o entendimento filosófico e ético do espiritismo. Eram (e são) idolatradas, lidas num ritual, decoradas e repetidas em sermões, cuja máscara incutia o sentimento daquilo que sempre evitava – o igrejismo.
Finalmente nos encontramos, EU e a DE.  Não por acaso, mas com certa dose de insistência mesmo porque não havia setas indicativas para ela. No centro espírita que me recebeu e me outorgou o direito de repensar não proporcionava, por uma pedagogia espírita, ir ao encontro da sua filosofia.  Esbarrávamos no único livro das obras kardequianas  - o Evangelho segundo o Espiritismo, lia-se pequenos trechos em reuniões e comentava-se depois .  Apenas isso.
Quando ela (a DE) apareceu não se apresentou de todo, foi uma aproximação lenta e fascinante que proporcionava uma admiração. De forma singela, despretensiosa, sem proselitismo, não se importou com a minha ansiedade em conhecê-la e nem a avidez de tê-la.  Apenas disse de forma curta e objetiva, “satisfação, sou ‘O Livro dos Espíritos’, acompanhe-me.”
Reconheço que foi muito difícil o início. Ela se dirigia a todos os lugares e a nenhum ao mesmo tempo. Em cada leitura me cobrava uma dedicação exclusiva para entender cada tema. Na investigação literária, obras clássicas de autores que tentaram desvendar o mundo estranho dos espíritos, como também a história de Allan Kardec no desenvolvimento da doutrina, pelas Revistas Espíritas, foram associadas ao meu estudo. As nuances doutrinárias produziram uma impressão salutar ao conjunto das minhas idéias. 
Mas, apareceu um grupo, que denominamos de GELD que insistia no mesmo propósito que o meu. Estudar essa senhora centenária – A Doutrina Espírita, através de seu principal livro, “O Livro dos Espíritos” isso foi o nosso vínculo.
Reconheço que nos mobilizamos lentamente, mas nessa particularidade estava o segredo em julgá-la melhor. O propósito não estava em cumprir de forma sistematizada, simplesmente em lê-la , mas entendê-la.  As nossas dúvidas eram e são ilimitadas, não havia como não nos debruçarmos minuciosamente sobre a sua filosofia e ter noção do seu perfil e dos seus princípios.
Foram 15 anos de encontros semanais, entre purgações de nossos fantasmas às discussões das vírgulas juntamente com os despojos das verdades particulares. Ficou como resultado o sentimento de conforto por saber que não sabemos. A convicção da busca foi a nossa melhor conquista.
Hoje posso garantir, sem ser pretensioso, que compreendo a Doutrina Espírita, porque me pôs em pé e a pé. Estendeu o horizonte e me deixou livre para seguir os caminhos. Incitou o livre pensar e questionar sem temor. Tornou a responsabilidade o compromisso comigo mesmo, sem pieguismo, cuja receita de comportamento diz respeito apenas a mim. Algumas vezes os exemplos são medidas que imprimem os pesos, mas as formas são particulares e os resultados pessoais.
Descobri que o evoluir é solitário.
Muito devo ao Grupo Espírita Léon Denis, conhecido como GELD.                         
As diversidades de idéias permitiram os debates, ampliaram as concepções filosóficas e tornaram indefinidas as definições. Contemplar cada membro do Grupo era e é, perceber a caminhada solitária de cada um à linha do horizonte, como eu."
Assim, inicio este blog para discutir abertamente sem termor às críticas e sem presunção de dono da verdade, mas apenas como um observador que tem o questionamento a forma de pensar.